Seja bem-vindo
Mata de São João,23/05/2025

  • A +
  • A -
Publicidade

Bebê Reborn: Entenda o fenômeno por trás de boneco que pode custar até R$ 1.500 em Salvador

Fonte: Bahia Notícias
Bebê Reborn: Entenda o fenômeno por trás de boneco que pode custar até R$ 1.500 em Salvador Foto: Reprodução / Bahia Notícias / Valter Campanato / Agência Brasil
Publicidade

Brincar de “pai” e “mãe”, uma atividade praticada por crianças, transcendeu as barreiras do público infantil e se tornou um passatempo para pessoas de diversas idades. A ordem cronológica considerada comum foi alterada, e objetos de uso de garotos e garotas para imaginar a vida adulta passaram a ser procurados e admirados por pessoas mais velhas.

 

Trata-se dos bonecos hiper-realistas, conhecidos também como “bebês reborn”. Esses brinquedos possuem características e formações que imitam intensamente os traços de crianças reais, como peso, aparência, tamanho e textura. O fenômeno virou alvo de grandes debates e discussões nas redes sociais, que foram além do universo infantil.


Os diálogos sobre o tema surgem em meio ao caso de uma jovem baiana de 25 anos que procurou uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) para atendimento de saúde para seu boneco. Ao chegar ao local, foi constatado que o suposto bebê era, na verdade, um boneco. Na ocasião, familiares da jovem relataram que ela comprou o bebê reborn pela internet por R$ 2,8 mil no mês passado.

 

O assunto resultou em proposições e projetos de Lei na Assembleia Legislativa da Bahia, onde um PL prevê a proibição desse tipo de atendimento em unidades públicas de saúde do estado. A medida, protocolada na última segunda-feira (19), também visa à aplicação de multas que podem chegar a mais de R$ 30 mil, além de vetar o uso do bebê reborn para acesso a benefícios reservados a crianças de colo, como filas preferenciais e gratuidades.


Outro PL semelhante foi apresentado em nível nacional, na Câmara dos Deputados, com o objetivo de restringir ou promover atendimento psicológico a pessoas que são donas dos chamados bebês reborn, bonecos ultrarrealistas que se tornaram uma febre recente no Brasil.

 

Diante dos questionamentos, que abrangem diversas áreas, a reportagem do Bahia Notícias procurou um integrante da comunidade reborn na capital baiana para entender melhor a prática, além de uma especialista da área de saúde mental para compreender se o ato seria saudável e profissionais de direito para saber os limites judiciais desses adeptos.

 

QUEM FAZ O BEBÊ REBORN?
Na capital baiana, a comunidade reborn pode ser encontrada através de fabricantes, entusiastas e artistas que produzem bebês reborn, além de pessoas que enxergam a temática como uma arte, conforme explicou ao BN a artesã Rosana Mascarenhas, da maternidade Zana Reborn.



Foto: Reprodução / Bahia Notícias


“A comunidade é composta pelos artistas, colecionadores e admiradores da arte reborn. O público consumidor é formado por pessoas de todas as faixas-etárias, desde crianças a idosos”, disse ao BN.

 

Para adquirir e encomendar um bebê reborn, o valor mínimo gira em torno de R$ 1.500. No entanto, quanto maior o realismo, mais caro será o valor da encomenda.



“Eu trabalho com valores a partir de R$ 1.500, sendo que a variação depende da qualidade dos materiais usados no bebê. Por exemplo, temos olhos de acrílico e olhos de vidro, que têm valores bem diferentes. Outro bom exemplo é o material do cabelo, que pode ser sintético, natural (mohair) ou humano, também com grande diferença de valor”, revelou Mascarenhas.

 

De acordo com a artesã, houve um aumento na quantidade de pessoas engajadas e que se tornaram adeptas da causa reborn.

 

“Com a viralização nas redes sociais, muita gente passou a conhecer os bebês reborn. Também houve aumento nas vendas, principalmente por colecionadores e pelo público infantojuvenil. A confecção leva de 15 a 30 dias, pois é feita manualmente com todos os detalhes para parecer o mais real possível. O cabelo é implantado fio a fio”, explanou.

 

O segmento reborn, inserido no setor de fabricação de brinquedos, está em um cenário de crescimento. Dados do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), via Receita Federal, fornecidos ao BN, mostraram uma crescente entre 2018 e 2025 na Bahia.


Atualmente, existem cerca de 95 empresas ativas de brinquedos no geral, sendo:

  • Microempreendedor Individual (MEI): 71 (75%)
  • Microempresa (ME): 22 (23%)
  • Empresa de Pequeno Porte (EPP): 2 (2%)

 

Já em Salvador, 24 entidades do ramo são ativas:

  • Microempreendedor Individual (MEI): 19 (79%)
  • Microempresa (ME): 5 (21%)

 

O ESTRANHO FAMILIAR NO BEBÊ REBORN
Além da questão política e social, o tema também é analisado no setor de saúde por especialistas. A coordenadora da comissão de saúde do Conselho Regional de Psicologia (CRP-BA), Amanda Sacramento, destacou que o incômodo causado pelos bonecos hiper-realistas está relacionado ao conceito freudiano do "estranho familiar" — algo que parece comum, mas, ao mesmo tempo, perturba.

 

“Freud fala sobre o conceito de ‘estranho familiar’, que é quando algo muito comum passa a causar estranhamento. Uma boneca normalmente remete ao lúdico, à infância, à brincadeira. Mas quando ela se parece demais com um bebê real, o que se sente não é só empatia — há também medo, repulsa, algo que perturba. Isso mexe com o inconsciente coletivo. A boneca se torna algo que está entre o real e o inanimado, e isso confunde os nossos sentidos”, afirmou a psicóloga.

 

Ela também relacionou o fenômeno ao uso simbólico dos objetos na tentativa de elaboração de perdas e traumas. Segundo Amanda, em casos traumáticos, existem situações de pessoas que se apegam a objetos ou sensações para manter sua perda “viva”, e o apego seria uma forma de preencher uma “solidão crônica”.

 

“Tem gente que perde uma pessoa querida e fica ouvindo o último áudio de WhatsApp várias vezes ao dia. A pessoa sabe que a outra morreu, mas o vínculo não se desfaz. É uma tentativa de manter viva uma presença. No caso do bebê reborn, pode haver algo semelhante: manter aceso o sonho da maternidade, simbolizar a ausência de alguém ou até preencher uma solidão crônica. Tudo isso precisa ser olhado com cuidado”, relatou a psicanalista.

 

Questionada sobre o impacto de questões sociais para a “explosão” dos bebês reborn, Amanda chamou a atenção para o recorte racial e a construção histórica em torno da infância e do afeto.

 

“A questão do bebê reborn é um fenômeno multifatorial. Eu poderia falar só da via emocional, mas não tenho como não fazer um recorte de marcadores sociais. A gente tem um marcador de raça, de classe, de gênero e também o aspecto do próprio capitalismo. É um tema muito rico. A boneca reborn, por exemplo, pode representar para uma mulher branca uma forma de preencher uma ausência. Mas, para mulheres negras, historicamente cuidadoras dos filhos alheios e não das próprias crias, o afeto sempre foi algo negado. É preciso olhar com mais profundidade”, comentou Sacramento.

 

A especialista também critica o papel das redes sociais na forma como essas histórias são tratadas publicamente. Durante a entrevista, ela defendeu que o tema seja discutido de forma ampla, envolvendo diferentes áreas do conhecimento, além da Psicologia, a Medicina, a Pedagogia e o Serviço Social.

 

“A internet transformou tudo em espetáculo. A dor virou conteúdo. A mulher com a boneca vira meme, vira vídeo de deboche. Isso é uma violência. E o pior: o sofrimento que aparece de forma visível é muitas vezes tratado com escárnio, enquanto os sofrimentos invisíveis — e talvez mais perigosos — continuam sendo ignorados. A psicologia não pode estar sozinha nisso. Precisamos do serviço social, da pedagogia, da medicina. E também precisamos entender que nem todo caso é patológico. Há mulheres que sabem que estão com uma boneca, mas dizem: ‘Ela me faz companhia’. Isso é humano. Isso é afeto. E o afeto, seja por um ser humano ou por um objeto simbólico, precisa ser respeitado”, observou Amanda.

 

JUSTIÇA E A GUARDA DO BEBÊ REBORN
“Pais” e “mães” de bebês reborn têm procurado até a Justiça para resolução de problemas. A advogada Suzana Ferreira viralizou nas redes sociais ao revelar um caso inusitado que chegou em seu escritório: um casal queria judicializar a disputa pela guarda de uma boneca hiper-realista do tipo bebê reborn, que imita um recém-nascido.

 

No entanto, de acordo com a advogada especializada em Direito Previdenciário e Processual Trabalhista, Carina Gomes, não há reconhecimento jurídico da figura do bebê reborn como pessoa, mesmo com o valor emocional empregado por seus “tutores”.

 

“O maior limite é o não reconhecimento jurídico da figura do bebê reborn como pessoa. Isso impede qualquer registro civil, inclusão como dependente em planos de saúde ou INSS; ações judiciais com base em laços de parentesco ou dever de sustento”, contou Gomes.

 

Conforme a especialista, bebês reborn não possuem direito a benefícios sociais, entre outros.

 

“Os bebês reborn, apesar do valor emocional e terapêutico que possam representar para algumas pessoas, não geram efeitos jurídicos no campo do Direito Social ou Previdenciário. Eles não são considerados sujeitos de direito — não há nascimento biológico, adoção ou guarda judicial envolvida, o que impede qualquer vínculo legal reconhecido”, indicou a advogada.

 

Segundo ela, existem alguns limites legais que não permitem que “mães reborns” tenham acesso a certos benefícios.

 

“Não há reconhecimento legal do vínculo. Logo, as chamadas ‘mães de bebês reborn’ não têm legitimidade jurídica para solicitar licença-maternidade, requerer salário-maternidade, obter pensão por morte ou qualquer outro benefício atrelado à existência de um dependente real. O limite é o próprio conceito de fato jurídico. O ordenamento jurídico brasileiro reconhece apenas relações familiares formalizadas e com efeitos legais”, completou Carina.




Publicidade



COMENTÁRIOS

Buscar

Alterar Local

Anuncie Aqui

Escolha abaixo onde deseja anunciar.

Efetue o Login

Recuperar Senha

Baixe o Nosso Aplicativo!

Tenha todas as novidades na palma da sua mão.